Autor: Joan Montecalvo Eichemberger e Silva
Data de produção: 25/10/2024
A locação de imóveis através de plataformas como o Airbnb tem se tornado uma prática cada vez mais comum em diversas cidades do mundo. A plataforma Airbnb registrou o recorde de mais de 2.330 cidades visitadas por seus usuários no Brasil em 2023, mais da metade do número de municípios do país, e com mais de 5 milhões de anfitriões em todo o mundo. No entanto, essa tendência também trouxe à tona uma série de desafios.
1) O Airbnb em condomínios residenciais: uma tendência crescente
Nos últimos anos, muitos proprietários de imóveis em condomínios viram no Airbnb uma oportunidade de rentabilizar suas propriedades de forma eficiente, especialmente em grandes centros urbanos e em áreas turísticas. A plataforma facilita o contato entre proprietários (ou locatários) e possíveis hóspedes, permitindo que qualquer pessoa alugue um quarto, um apartamento ou uma casa inteira por curtos períodos.
Essa prática é particularmente atraente para pessoas que possuem imóveis desocupados ou que viajam frequentemente e desejam ganhar uma renda extra durante os períodos em que não utilizam o imóvel. No entanto, ao contrário das locações tradicionais, a locação via Airbnb é caracterizada pela alta rotatividade de inquilinos e pela informalidade do processo, o que pode causar desconforto entre os demais condôminos e na administração condominial.
2) A legislação sobre locações de curta temporada em condomínios
A locação de curta temporada, como é o caso dos imóveis alugados via plataformas como o Airbnb, levanta questões legais importantes. No Brasil, a regulamentação desse tipo de locação não é completamente uniforme e observada em muitos casos, inobstante o STJ em 2021 definir que condomínios podem proibir moradores de locarem os imóveis por meio do site Airbnb, desde que haja previsão expressa de destinação residencial das unidades em sua convenção.
Originalmente, a Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/91) regulamenta a locação de imóveis urbanos e, embora tenha sido elaborada antes da popularização das plataformas digitais, pode ser aplicada às locações por temporada (aquelas com duração máxima de 90 dias). No entanto, referida lei não trata especificamente sobre o impacto dessas locações em condomínios residenciais.
Muitos condomínios têm buscado alternativas para regular ou mesmo proibir a locação de curta temporada em suas unidades. Algumas convenções condominiais, por exemplo, estabelecem regras claras sobre a destinação das unidades, restringindo seu uso para fins residenciais e aplicando a decisão do STJ supramencionada. Em alguns outros casos, a proibição da locação de curta temporada pode ser justificada sob o argumento de que a alta rotatividade de hóspedes compromete a segurança e o bem-estar dos moradores.
No entanto, a legalidade dessas proibições tem sido questionada. Alguns proprietários defendem o direito de dispor de seus imóveis como bem entenderem, inclusive para fins de locação de curta duração. Tribunais têm se debruçado sobre essa questão, e as decisões judiciais variam conforme o caso. Em alguns julgados, os tribunais decidiram em favor dos condomínios, especialmente quando a convenção condominial estabelece restrições explícitas à locação por temporada. Em outros, as decisões favoreceram os proprietários, alegando que a locação via Airbnb é compatível com o uso residencial das unidades, contrariamente ao disposto na decisão do STJ de 2021 (sendo objeto de reanálise agora em 2024 – Resp 2.121.055), considerando que a destinação não é pura e exclusivamente residencial.
3) Impactos no cotidiano dos condomínios
A locação de unidades residenciais em condomínios via Airbnb pode ter diversos impactos no cotidiano dos condôminos e na administração do condomínio. Entre os principais pontos de atenção estão:
A. Segurança: O aumento da circulação de pessoas desconhecidas no condomínio pode gerar um sentimento de insegurança entre os residentes. Em muitos casos, os hóspedes temporários não têm o mesmo nível de compromisso com as regras do condomínio que os moradores permanentes.
B. Convivência: A rotatividade frequente de hóspedes também pode afetar a harmonia entre os condôminos. Muitas vezes, hóspedes temporários podem não estar familiarizados com as regras internas do condomínio, como horários de silêncio, uso de áreas comuns e normas de convivência.
C.Infraestrutura: A utilização intensa das áreas comuns, como piscinas, academias e salões de festas, por parte dos hóspedes de curta duração também pode sobrecarregar a infraestrutura do condomínio, gerando desgaste e aumento nos custos de manutenção.
D. Administração condominial: É comum que síndicos e administradores precisem lidar com reclamações de moradores sobre a conduta de hóspedes temporários, bem como questões relacionadas ao controle de acesso e uso das áreas comuns. Além disso, o aumento da rotatividade de pessoas pode exigir uma maior vigilância e fiscalização por parte da equipe de segurança.
4) Como os condomínios têm lidado com o Airbnb
Para lidar com os desafios trazidos pela locação de imóveis via Airbnb, muitos condomínios têm adotado diferentes estratégias. Entre as medidas mais comuns estão:
A. Alteração da convenção condominial: Alguns condomínios optam por modificar suas convenções para incluir regras específicas sobre a locação de curta temporada. Essas mudanças geralmente precisam ser aprovadas em assembleia geral e podem incluir desde restrições à locação de curta duração até a proibição total dessa prática.
B. Controle de acesso mais rigoroso: Outra medida que vem sendo adotada por muitos condomínios é o reforço no controle de acesso, com a exigência de prévia comunicação à administração sobre a chegada de novos hóspedes e a verificação de documentos.
C. Taxas adicionais: Em alguns casos, os condomínios têm instituído taxas extras para cobrir o aumento nos custos de manutenção e segurança gerados pela alta rotatividade de pessoas.
D. Mediação de conflitos: A administração condominial também pode atuar como mediadora de conflitos entre moradores e proprietários que alugam suas unidades por curta temporada.
5) O futuro do Airbnb em condomínios
Com o crescimento contínuo do turismo e a popularização de plataformas como o Airbnb, é provável que a locação de imóveis em condomínios siga em alta. No entanto, para que essa prática se torne sustentável e equilibrada, será necessário encontrar um ponto de equilíbrio entre os interesses dos proprietários, dos hóspedes e dos moradores permanentes.
Em síntese, a locação de imóveis via Airbnb em condomínios representa uma nova realidade que demanda adaptações. Com diálogo e regulamentação adequada é possível conciliar os interesses de todas as partes envolvidas e garantir uma convivência harmoniosa e segura para todos os moradores.
Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da AASP .
Joan Montecalvo Eichemberger e Silva
Minibio: Advogado. Pós-Graduado em Direito Corporativo e Compliance – Graduando em Direito Digital, Proteção de Dados e Cibersegurança.