Autora: Maximilian Köberle
Data de produção: 10/12/2024
1. Características
O Direito atribuiu personalidade jurídica a um patrimônio: um bem, um prédio, uma quantidade de dinheiro, denominando esta nova ficção de “fundação” (CC, art. 62).
A fundação não tem dono, nem sócios, nem associados. Os atos constitutivos de uma fundação – denominados “estatuto social” – não indicam sócios, nem associados. Também não há um proprietário com plenos poderes para ditar como ou para onde uma fundação deve seguir. Via de regra, a administração de uma fundação é composta por uma assembleia geral, com função deliberativa e normativa, e uma diretoria, com função executiva, além do conselho fiscal, com função fiscalizatória.
Para assegurar que a fundação esteja cumprindo com sua finalidade institucional, o Ministério Público tem a função de velar pelas fundações (Código Civil, art. 66). Por esta razão, todas as atas da assembleia da fundação, inclusive a que aprova o seu estatuto social, devem ser homologadas pelo curador de fundações da jurisdição antes de serem registradas no Registro de Pessoa Jurídica. Ao final de cada exercício, a fundação deve prestar contas de suas atividades ao curador de fundações por ela responsável.
2. Contabilidade e Tributação
No âmbito contábil, não há uma lei específica disciplinando a contabilidade ou as finanças de uma fundação. Com efeito, existem duas leis sobre contabilidade: a que trata das finanças públicas, Lei nº 4320/1964, e a que trata das sociedades por ações, Lei 6.404/1976 (“Lei das SA´s”). Como a fundação não integra a Administração Pública, tampouco tem natureza empresarial, tem como referência apenas as Normas Brasileiras de Contabilidade (“NBC”) e Instruções Técnicas (“ITG”), emitidas pelo Conselho Federal de Contabilidade.
É que a fundação faz parte do denominado “Terceiro Setor” da Economia. Enquanto a Administração Pública (pessoas jurídicas de direito público, CC, art. 41) compõe o Primeiro Setor e o “Mercado” (sociedades empresárias, CC, art. 44, inc. II) compõe o Segundo Setor, o Terceiro Setor é composto por instituições privadas sem fins lucrativos (CC, art. 44, inc. I, III, IV e V): fundações, associações, organizações religiosas e partidos políticos.
Também não há uma legislação tributária que simplifique a tributação da fundação, como existe para as micro e pequenas empresas optantes do “Simples”, nome abreviado do “Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte”, que institui um regime tributário diferenciado, simplificado e favorecido previsto pela Lei Complementar nº 123, de 2006.
3. Imunidade Tributária
A fundação que exercer atividade de educação e assistência social faz jus à imunidade tributária dos impostos (independente de certificação, CF, art. 150, inc. VI, letra “c”) e contribuições previdenciárias (depende de certificação, CF, art. 195, §7º c/c LCp nº 187/2021).
A Constituição Federal, art. 205, define que a educação tem 3 objetivos: “pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. Já a assistência social tem os objetivos definidos no art. 203: “I – a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; II – o amparo às crianças e adolescentes carentes; III – a promoção da integração ao mercado de trabalho; IV – a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária; V – a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei. VI – a redução da vulnerabilidade socioeconômica de famílias em situação de pobreza ou de extrema pobreza.”
Registre-se que “qualificação para o trabalho” é objetivo da educação e “promoção da integração ao mercado de trabalho” é da assistência social. Por tal razão, entidades que concedem bolsas de estudos estão exercendo atividades de educação e assistência social (CARRAZZA:2008[1])
Para os fins dos impostos, o Código Tributário Nacional, recebido pelo atual ordenamento constitucional com status de lei complementar de que trata a Constituição Federal, art. 146, fixa, no art. 14, os requisitos para regulamentar a limitação constitucional do poder de tributar (“imunidade”).
4. Conclusão
O cenário jurídico enfrentado pelas entidades do Terceiro Setor é extremamente desafiante.
Apesar de merecer amplo apoio do Poder Público, pois o Terceiro Setor exerce atividades a ele atribuídas constitucionalmente (saúde, educação e assistência social, em síntese), é demasiadamente onerado com obrigações destinadas às sociedades empresariais (mesmo não tendo finalidades lucrativas), muitas vezes pagando os mesmos tributos que as sociedades empresárias (não raras vezes pagando mais, se comparadas com as empresas optantes pelo Simples) e tratada – no âmbito da lei – pelos órgãos de fiscalização da mesma forma que sociedades empresárias (com fins lucrativos; via de regra, a legislação equipara fundações e associações às “empresas”).
[1] Carrazza, Roque Antonio. A Imunidade Tributária das Fundações de Direito Privado Sem Fins Lucrativos: arts. 150, VI, “C”; 150, §4º, e 195, §7º da Constituição Federal. Brasília: Rossetto, 2006;
Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da AASP
Maximilian Köberle
Minibio: Advogado de fundação por 17 anos. Especialista em Direito Tributário, MBA em Gestão Empresarial.