Paz aos honorários advocatícios

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Autor: Danilo da Silva Braga

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Data de produção: 13/06/2024

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Já li inúmeros artigos que tratavam dos motivos da insegurança jurídica no Brasil. Um dos autores, cujo nome não me recordo, explicava que alguns juristas tinham o hábito de discutir questões jurídicas de maneira infindável.

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Sobre a discussão ad aeternum (sem fim), não há problemas, porque o Direito não é uma ciência exata.

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No entanto, o autor ressaltava que essa prática é comumente realizada pelos Tribunas Superiores, nas ocasiões em que mudam de entendimento frequentemente, gerando nítida insegurança jurídica aos jurisdicionados (cidadãos, empresas, órgãos públicos). Isso é um fato e ultrapassa a maleabilidade do Direito, temos que dar razão ao articulista.

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Infelizmente essa prática ocorreu novamente, dessa vez sobre o “pão de cada dia” da advocacia: os honorários advocatícios.

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Vejam só, em março de 2022, o STJ julgou o Tema Repetitivo no 1076[1] e estabeleceu que a fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. É obrigatória a observância dos percentuais previstos nos §§ 2o ou 3o do artigo 85 do CPC[2].

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Em outras palavras, na fixação dos honorários sucumbenciais, o juiz ou tribunal devem aplicar os percentuais estabelecidos nos §§ 2o e 3o do artigo 85 do Código de Processo Civil. Em regra, os percentuais variam entre 10% e 20% sobre o valor da condenação, do proveito econômico ou sobre o valor da causa, ressalvados os limites previstos nos incisos II a V do §3°, que dizem respeito as condenações da Fazenda Pública (União, Estado, Municípios, Autarquias e Fundações Públicas).    

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Ocorre que, em menos de 3 (três) anos após o julgamento do Tema no 1076, a 1ª seção do STJ discutiu recentemente a mesma questão (honorários sucumbenciais) e não aplicou o entendimento estabelecido pelo Órgão Especial[3]

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A decisão da 1ª seção do STJ tratou dos honorários sucumbenciais fixados contra a Fazenda Pública no âmbito da execução fiscal, nos casos de acolhimento de exceção de pré-executividade em decorrência de ilegitimidade passiva.

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Como é do conhecimento de todos(as), a execução fiscal está prevista na Lei no 6.830/80 e se trata de uma ação judicial na qual a Fazenda Pública (União, Estado, Municípios, Autarquias e Fundações Públicas) cobra a chamada “dívida ativa”, normalmente um crédito tributário ou multa, não honrados no prazo legal.

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Nesse contexto, nas execuções onde o executado (empresa ou cidadão) está sendo processado de maneira ilegítima, ou seja, não tem a obrigação legal de pagar a dívida ativa que está sendo cobrada, cabe ao advogado requerer que essa pessoa seja excluída do processo (polo passivo da ação). Esse pedido, via de regra, é realizado mediante “exceção de pré-executividade”, instrumento processual utilizado para defesa da parte.

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Quando o advogado obtém êxito na referida exceção de pré-executividade, o cliente (executado) é retirado da ação e a dívida ativa excluída do seu nome. Ademais, havendo penhora de bens no patrimônio do executado, o ato também é desfeito.

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É fácil notar que o acolhimento da exceção de pré-executividade nos casos de ilegitimidade passiva tem extrema relevância na vida de quem está sendo processado, uma vez que a parte é excluída do processo e, principalmente, a dívida deixa de ser cobrada indevidamente em seu nome.     

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No entanto, segundo a 1ª seção do STJ, nas hipóteses em que há a exclusão de coexecutado por ilegitimidade passiva, com o acolhimento de exceção de pré-executividade, na qual não houve impugnação do crédito, os honorários sucumbenciais devem ser arbitrados de forma equitativa, uma vez que, conforme os julgadores, o benefício econômico é inestimável (art. 85, parágrafo 8o, CPC/2015). Para demonstrar, cita-se um trecho da ementa do julgado, vejamos:

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“Deve ser adotado o entendimento adotado pela Primeira Turma do STJ, no sentido de que, nos casos em que a exceção de pré-executividade visar, tão somente, à exclusão do excipiente do polo passivo da execução fiscal, sem impugnar o crédito executado, os honorários advocatícios deverão ser fixados por apreciação equitativa, nos moldes do art. 85, § 8º, do CPC/2015, porquanto não há como se estimar o proveito econômico obtido com o provimento jurisdicional” (STJ, EREsp 1.880.560/RN, Primeira Seção, Relator: Ministro Francisco Falcão, j. 24/04/2024, DJe 06/06/2024).

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Ora, em que pese o judicioso voto vencedor que resultou na tese colacionada acima, questiona-se: no acolhimento de uma exceção de pré-executividade, em decorrência de ilegitimidade passiva, não há proveito econômico estimável? 

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A resposta parece óbvia, pois, se uma empresa (coexecutada) foi cobrada judicialmente por uma dívida de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) e é excluída do polo passivo da ação, o proveito econômico da executada é o afastamento de um débito de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) que pesava contra si (CADIN, penhoras, apontamento judicial) — benefício nitidamente estimável. Desse modo, em execuções dessa natureza (pluralidade de partes no polo passivo), não há que se falar em inexistência de proveito econômico.

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Ademais, a prática demonstra que a fixação dos honorários com base na apreciação equitativa redunda em verbas sucumbenciais irrisórias em favor do(a) patrono(a) que atuou na execução fiscal e obteve êxito em favor do seu cliente.

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Portanto, nos casos em que a parte for excluída do polo passivo da execução, ainda que sem discutir o crédito fiscal, adiro à interpretação de que os honorários advocatícios contra a Fazenda Pública devem ser fixados com observância da boa e sagrada Lei, sobretudo o artigo 85, §3o, da Lei no 13.105/2015, conforme ficou estabelecido na tese fixada no julgamento do Tema no 1076, pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça.       

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Por fim, como “a Justiça é algo essencialmente humano” (Aristóteles)[4], dessa vez a classe perdeu. Mas prossigamos, pois, segundo o grande jurista Heráclito Fontoura Sobral Pinto, a advocacia não é profissão para covardes.

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[1] STJ, Tema Repetitivo no 1076, Corte Especial, j. 16/03/2022, DJe 31/05/2022.

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[2] Lei no 13.105/2015.

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[3] STJ, EREsp 1.880.560/RN, Primeira Seção, Relator: Ministro Francisco Falcão, j. 24/04/2024, DJe 06/06/2024.

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[4] Ética a Nicômaco. Tradução de Leonel Vallandro e Gerd Bornheim da versão inglesa de W. D. Ross. São Paulo: Abril Cultural, 1979.

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Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da AASP .

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Danilo da Silva Braga

Minibio: Advogado, pós-graduado em Direito Constitucional. Relator da Comissão Permanente de Seleção e Inscrição da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de São Paulo. Atuante em questões empresariais e imobiliárias.  Apaixonado pela Justiça.

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