Segunda Turma confirma que primeira transexual da FAB não poderia ter sido aposentada no posto de cabo

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Atualizada em 20/04/2021, às 17h43

A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou um recurso interno (agravo) da União para reverter decisão do ministro Herman Benjamin que, em junho do ano passado, havia mantido acórdão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) que garantiu a Maria Luiza da Silva – reconhecida como primeira transexual dos quadros da Força Aérea Brasileira (FAB) – o direito de se aposentar no último posto da carreira militar no quadro de praças, o de subtenente.

Entretanto, em razão do argumento da União de que só seria possível chegar a subtenente mediante participação em processo seletivo aberto a civis e militares (e não por meio de promoção), a turma considerou necessário que a questão seja reanalisada pelo juízo competente para cumprir o julgado, que terá melhores condições de avaliar qual posto poderia ter sido alcançado pela militar – sendo certo, de acordo com a turma, que esse posto não é o de cabo, patente em que havia sido indevidamente aposentada pela Aeronáutica.

Até que a controvérsia seja analisada pelo juízo da execução, a turma manteve o direito de Maria Luiza permanecer aposentada no posto de subtenente, estando vedada, ainda, a incidência de desconto ou cobrança de multa pela utilização de imóvel funcional pela militar.  

Prematuro e ​ilegal

Na decisão monocrática, o ministro Herman Benjamin entendeu que, de forma prematura e ilegal, a militar foi posta na reserva, após ter realizado cirurgia de mudança de sexo – o que lhe retirou a oportunidade de progredir na carreira. A ilegalidade também foi reconhecida no primeiro e no segundo graus de jurisdição.

 A Aeronáutica a considerou incapaz para o serviço militar, com base no artigo 108, inciso VI, da Lei 6.880/1980, que estabelece como hipótese de incapacidade definitiva e permanente para os integrantes das Forças Armadas acidente ou doença, moléstia ou enfermidade sem relação de causa e efeito com o serviço militar.

Consequência nat​​​ural

No recurso à Segunda Turma, a União alegou que houve reformatio in pejus no acórdão do TRF1 – o qual reconheceu o direito de Maria Luiza às eventuais promoções por tempo de serviço no período em que esteve ilegalmente afastada da atividade –, pois as promoções derivadas da reintegração não foram requeridas na origem.

Para o ministro Herman Benjamin, no entanto, o acórdão encontra-se em sintonia com o entendimento do STJ sobre o tema, ao definir que, após a anulação do processo administrativo, por consequência natural, estão assegurados à autora, automaticamente, as promoções e o soldo integral, bem como o direito à moradia.

"O direito do militar às promoções é automático em caso de anulação do ato que o excluiu dos quadros ou o conduziu à inatividade, independentemente, por conseguinte, de pedido expresso, nos termos inclusive das regras dos artigos  e 322, parágrafo 2º, do Código de Processo Civil, que determinam a interpretação do pedido à luz do conjunto que compõe a postulação", afirmou.

Discrim​​inação

De acordo com o relator, seria inconcebível, como defendeu a União, que a militar tivesse direito à aposentadoria integral apenas no posto de cabo engajado (como foi aposentada).

"Prestigiar tal interpretação dos julgados da origem acentua, ainda mais, a indesculpável discriminação e os enormes prejuízos pessoais e funcionais sofridos pela recorrida nos últimos 20 anos em que vem tentando – agora com algum êxito – anular a ilegalidade contra si praticada pelas Forças Armadas do Brasil", afirmou o relator.

Apesar disso, em vista do argumento da União quanto à impossibilidade de chegar a subtenente sem participação em processo seletivo, Herman Benjamin entendeu ser necessário que o juízo responsável pelo cumprimento da decisão possa avaliar, em ambiente de pleno contraditório, qual posto poderia ter sido alcançado pela militar se ela estivesse na ativa – se terceiro-sargento ou suboficial.​

Leia o acórdão.

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